segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

De Wuerl para Burke - Para bom entendedor, meia palavra basta


Recentemente o cardeal Raymond Burke concedeu uma entrevista ao canal de televisão francês France 2 na qual afirmou, em resposta a uma pergunta feita pela jornalista, que se o Papa Francisco persistir nessa direção - a de permitir a comunhão aos divorciados recasados civilmente - ele "resistiria". Burke declarou também que o que vem acontecendo na igreja é doloroso e difícil.

Não é segredo para ninguém que Burke foi a ponta de lança no último sínodo, vocalizando a opinião de muitos bispos e até alguns cardeais sobre essa mesma questão e deixando claro que a doutrina da Igreja não pode ser alterada, muito menos a sua prática pastoral em relação aos divorciados recasados. Desde o ano passado o cardeal americano, um renomado canonista, sofreu consideráveis perdas e humilhações vindas de ninguém menos que do próprio Papa Francisco. 

Burke foi removido de todas as congregações vaticanas, sobretudo a dos bispos. Por último foi removido da Cúria Romana como um todo, sendo substituído por um nome sem relevo e com um currículo bem modesto quando comparado ao do prelado americano, bem ao gosto do Papa Francisco que demonstra uma bizarra preferência por sacerdotes pouco qualificados para comandar postos importantes.

Nos últimos dias do ano passado, se ouviu na blogosfera rumores sobre a insistência de alguns prelados - ainda anônimos - para que Burke fosse sumariamente removido do colégio de cardeais. O boato circulou alguns dias antes do anúncio da remoção de Burke como prefeito da Signatura Apostólica.

Há dois dias o cardeal Wuerl, arcebispo de Washington, saiu com a cara e a "coragem" no ataque contra Burke, embora sem citar o nome do irmão bispo. Num artigo publicado em seu blog pessoal, o cardeal Wuerl afirma:

"enquanto eu assistia ao Santo Padre pela TV, minha caixa de e-mail está repleta com um número de e-mails sobre uma entrevista e um artigo por irmãos bispos que estão pouco entusiasmados com o Papa Francisco".

No texto o cardeal divaga sobre a sua história pessoal enquanto seminarista e sacerdote, refletindo sobre a resistência que os papas encontravam ao longo da história quando colocavam seus ensinamentos. Reflete sobre as encíclicas Mater et Magistra de João XXIII e a famosa Humanae Vitae de Paulo VI, todas muito criticadas.

Mas a passagem direcionada milimetricamente ao cardeal Burke é esta:

"Mas um padre do seminário gentilmente nos tirou da nossa ingenuidade e apontou que sempre existiram correntes de dissenso na Igreja, algumas vindas do alto como do colégio de Cardeais. Foi então que eu ouvi pela primeira vez sobre o cardeal Louis Billot que foi pouco discreto na sua oposição ao Papa Pio XI que havia condenado o movimento politico e religioso Action Française, que envolvia muitas pessoas que desejavam pela restauração da monarquia na França e um papel forte da Igreja no governo civil. Em 1927, o cardeal Billot foi 'persuadido a renunciar a sua dignidade cardinalícia'. E ele voltou a ser um simples padre jesuíta"

Sugestivo, não é mesmo? Mas tem mais. Alguns parágrafos mais abaixo, lemos:

"De forma menos importante, houve um considerável mal estar entre alguns [prelados] em 1969 quando a Secretaria de Estado de Paulo VI publicou uma instrução sobre a vestimenta dos bispos e cardeais. O esforço para simplificar e remover algumas coisas como a cappa magna aborreceu a alguns"

O cardeal Burke, além da sólida formação jurídica e doutrinal, é também conhecido internacionalmente como um defensor da liturgia tradicional e aparece com frequência paramentado com a "nefasta" cappa magna. De forma particular, devemos notar a ironia e como a cappa, hoje, aborrece alguns prelados de 2015, sobretudo por estar associada a juventude católica que preenche os bancos das igrejas quado das missas tradicionais.

Da mesma forma que Burke é um cardeal Ratzingeriano, Wuerl é um bergogliano incurável. O arcebispo de Washington nunca usou a pena ou levantou a voz em defesa de Bento XVI ou de João Paulo II, mas é o primeiro prelado americano a disparar contra os supostos 'inimigos' de Bergoglio. Wuerl, como Bergoglio, não vê problema em, por exemplo, dar a comunhão a divorciados e a políticos pró-aborto. Ratzinger e Burke eram ferozmente contrários a isso. Wuerl e Bergoglio não compreendem o que significa a expressão "valores inegociáveis".

Continua Wuerl:

Uma das coisas que aprendi em todos esses anos desde os ingênuos dias de 1961 foi que feita uma análise meticulosa vemos que há um fio comum que une todos esses dissidentes. Eles discordam do Papa porque ele não concorda com eles e, portanto, não segue as suas posições.

Querer comparar a resistência que Francisco vem enfrentando com, por exemplo, a resistência que Paulo VI enfrentou com a Humanae Vitae é tentar falsificar a história. É uma atitude, diria, digna de Lenin e cia.

Francisco não enfrenta uma resistência por afirmar alguma doutrina ou ensinamento católico, mas por se distanciar dele. Francisco, hoje, é o dissidente.

Wuerl está certo quando afirma que na história da Igreja sempre tivemos figuras de dissenso, mas erra ao assumir que o Papado é imune a isso. Hoje vemos que a principal figura de dissenso é o Papa Francisco e o pseudo-magistério que vem desenvolvendo de forma arbitrária e totalitária.

Nunca na história da Igreja tantas vozes genuinamente católicas se levantaram contra o sucessor de Pedro. Historiadores, vaticanistas, jornalistas, padres, bispos, cardeais, simples leigos, etc. de forma direta ou indireta, vocalizando contra o que vem do trono petrino. Já na caixa de comentários do blog do cardeal americano vemos as várias "vozes do dissenso" se manisfestando.

É importante considerar a justa medida das críticas. É importante vigiarmos pela unidade da Igreja, evitando que divisões se tornem cismas. Mas é ainda mais importante preservar a integridade da doutrina da Igreja porque esta, afinal, vem do próprio Cristo e não do trono de São Pedro. Jesus pediu a Pedro que confirmasse seus irmãos na fé, mas não que lhes desse uma outra fé.

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