O que realmente me incomodou na última polêmica envolvendo o Papa não foi tanto o desvio ou mau uso das suas palavras pela mídia global - francamente, isso era bem previsível. Não foi tanto o Papa ter dito que, num caso de relacionamento entre um homem e um prostituto, a camisinha não seria uma método contraceptivo (o que não deixa de ser verdade, porque dois homens não podem conceber, não é mesmo?). E tem a polêmica da AIDS, da moral, etc...
Na verdade, o que realmente me incomodou é uma direção que o Papa toma quando o assunto são seus livros pós-2005. Em Jesus de Nazaré, Bento XVI afirma logo nas primeiras páginas que seu trabalho não pretende ser uma obra magisterial e que qualquer um é livre para discordar das opiniões contidas ali.
Ok. O Papa não é infalível, magisterial ou absoluto em cada espirro. Isso é fato. As condições da infalibilidade são, ironicamente, muito restritas. Contudo, quando se elegeu Papa, em abril de 2005, Joseph Ratzinger morreu.
Um engenheiro é um profissional que atua X horas por dia. Quando está em casa, com a família, ele assume o papel de pai, marido, filho, etc. O mesmo não se pode dizer daqueles chamados ao sacerdócio ou episcopado. Por isso eles são vocacionados, chamados, e não contratados ou admitidos. Eles o são para sempre, 24 horas por dia.
As opiniões de um Papa, magisteriais ou não, terão um peso imenso dentro do orbe católico. Na minha humilde opinião, quando Bento XVI se comporta como Joseph Ratzinger, a confusão é grande e resulta sempre num estrago para a Igreja.
Não acredito que a polêmica da camisinha vai caminhar mais do que já caminhou. O mundo rápido e ávido por notícias alarmantes tem um lado positivo: rapidamente muda seu foco. A polêmica já acabou.
No diálogo com Peter Seewald, como em Jesus de Nazaré, o foco da atenção não foi Bento XVI, mas Joseph Ratzinger. Parece confuso? E é mesmo!
Nunca, até onde sei, um Papa lançou livros teológicos fora da sua função de Papa, ou seja, afirmando que não se trata de uma obra do pontificado atual. JPII lançou vários livros, mas em todos emitiu juízos como pontífice (corrijam-me se estiver errado).
Parece que o papado torna-se uma instituição de fato, onde o Papa é um mero administrador de uma função e não o Vigário de Cristo na Terra.
Sem contar o impacto que o "podem discordar de mim a vontade" pode ter subjetivamente em várias pessoas, num mundo onde a autoridade pontifícia é questionada e contrariada cotidianamente.
Essa confusão toda me deixa... confuso!