Sempre que escrevo sobre o aborto (como aqui e aqui), repito que não reconheço a nenhuma pessoa a liberdade de decidir quando uma vida humana começa. Sendo assim, por lógica, me é impossível condescender com o aborto por uma questão simples e objetiva: não se pode diferenciar aquilo de um assassinato.
Mas essa, reconheço, é uma ressalva pessoal de ordem moral. No campo científico, há correntes as mais diversas emitindo opiniões sobre o assunto. Há os que digam que até a terceira semana de gestação ainda não temos vida; há os que dizem que a vida começa mais adiante ainda, lá pelo terceiro mês. E há muitos outros, cada um portador de sua própria certeza. Eu prefiro reconhecer as minhas incertezas e, aceitando minha insignificância humana, afastar de mim esse cálice. Se nem a ciência consegue estabelecer, com 100% de certeza e sem qualquer sombra de dúvida quando se inicia a vida, melhor não chutar uma possibilidade a fim de justificar o fim de uma gravidez. Prefiro me oport à prática, do que correr o risco de chancelar o homicídio. Mas já divago um tanto… Retomo.
Dizia que há várias opiniões sobre até qual estágio da gravidez o aborto poderia ser executado, cada uma defendendo suas verdades com base no que entendem sobre “liberdade da mulher” e “início da vida”. E aí a fauna é muito variada… Há, como já mencionei no blog, uma corrente que defende um tal de “aborto com nascimento parcial” – o que quer que tal paradoxo signifique… -, executado depois do sexto mês de gestação!
Sou um conservador – nunca neguei isso – e não consigo sequer ler a respeito dessa atrocidade sem sentir a bílis na garganta. Perdoem minha ortodoxia, mas qualquer retórica empregada para justificar o que vai acima é mera macaquice verborrágica. Nunca pensei que tomaria conhecimento de algo mais nojento do que isso, mas a capacidade dos”humanistas da cureta” de descer às profundezas do inferno parece infinita.
Descobri hoje que há no mundo gente – como os acadêmicos Alberto Giublini e Francesca Minerva – engajada numa monstruosidade denominada ABORTO PÓS-NASCIMENTO. A íntegra do – como chamaremos? – estudo destes está aqui, sob o título “Aborto pós-nascimento: por que o bebê deveria viver?”. Aos que tiverem estômago forte, recomendo a leitura. Desde já adianto: não há maneira civilizada de analisar os argumentos da dupla sem se sentir diante do horror em estado puro.
Segundo esses iluminados, o tal aborto pós-nascimento – que nada mais é que umassassinato puro e simples – deveria ser um recurso aceito em qualquer caso (sim, eles defendem que pais possam decidir matar seus filhos livremente!), mas em especial quando as crianças “não têm potencial para uma vida saudável”. De acordo com eles, crianças acometidas de moléstias (como a síndrome de Down, por exemplo) acabam acarretando um “ônus excessivo” às famílias. Argumentam que mais despesas financeiras, mais trabalho e outras coisas decorrentes seriam consequências que ninguém deveria ser obrigado a suportar. Então sugerem que se possa abater os recém-nascidos!
Mas e entregar as crianças à adoção? Bem, os dois são contra e dizem sem rodeios por quê:“precisamos considerar os interesses da mãe, que pode sofrer angústia psicológica ao ter de dar seu filho para adoção”. Não é fascinante?! Há que se ter em mente a “angústia da mãe” ao ver seu filho entregue à adoção, como se decidir matar tal filho não significasse algo infinitamente pior! Aliás, não deixa de ser sociologicamente interessante notar a preocupação desses “humanistas” com as angústias e dores da mãe, mas a disposição clara e inarredável de ignorar o recém nascido que será ASSASSINADO!
“Mas esse tipo de pensamento é minoritário.” Sim, ainda é. O que pretendo aqui, uma vez mais, é mostrar a vocês por que sou radicalmente contra o dal “direito ao aborto”: como garantir que isso, uma vez considerado legítimo, não seja a rachadura inicial no muro que separa a civilização da barbárie? Quem “guardará os guardiões”? Quem, enfim, estabelecerá os limites da coisa toda, para que um dia não se chegue ao mundo ideal de Alberto Giublini e Francesca Minerva, onde recém-nascidos poderão ser livremente ASSASSINADOS ao bel prazer de seus pais, com aval das leis vigentes?
A verdade é que, como cético, não confio no ser humano essencialmente bom. Se ele o fosse, Rousseau estaria certo… Se ele o fosse, não precisaríamos ceder parte de nossas liberdades a um ente abstrato denominado Estado, para que o exercício das liberdades de um indivíduo não acabasse avançando sobre as liberdades dos demais. Assim, da mesma forma que não confio no ser humano para determinar o exato momento em que começa uma vida, também não desejo vê-lo iniciando um debate que pode acabar levando à discussão sobre o eventual direito de assassinar bebês recém-nascidos.
Peço que entendam (e perdoem, de novo) meu conservadorismo. Ou, como preferem os iluminados modernos, meu obscurantismo… Mas não consigo ser tão “tolerante e humano” quanto os modernosos iluministas, que decidiram não tolerar os bebês e descartá-los de forma tão desumana.