domingo, 25 de agosto de 2013

Críticas ao Papa Bergoglio

Cinco meses após a eleição de Jorge Mario Bergoglio como sucessor de Bento XVI, todo católico pode perceber a sensível mudança de humor da mídia e da opinião pública – esta última moldada pela primeira – em relação ao papado.

Com Bento XVI a mídia se animava com qualquer sinal de “sangue”. Casos de pedofilia, escândalos financeiros do IOR, documentos confidenciais vazando, etc. Tudo isso desapareceu dos jornais e noticiários como por mágica. O que importa agora, segundo os periodistas, é acompanhar o cotidiano do papa do povo, é vê-lo sair aos jardins do Vaticano conferindo se os padres e bispos estão usando um fusca ou um Lamborghini, fotografá-lo a cumprimentar carpinteiros e empregados, beijando crianças, almoçando com o povo... e poderíamos listar até o infinito.

E não podemos esquecer que Bergoglio é, no final das contas, um argentino e está sujeito aos acessos de peronismo como toda figura pública do país vizinho.

Francisco impôs ao seu pontificado um estilo populista. Mesmo os mais indulgentes – conservadores – não poderão negar que algumas atitudes do novo papa vão nessa direção. Isso não é necessariamente ruim ou prejudicial à Igreja quando estamos em condições normais. O grande problema é que não estamos nessas condições.

Criou-se um grande contraste entre este pontificado e os dois últimos, sobretudo o do ainda vivo Papa (Emérito) Bento XVI. Francisco é caridoso, amável, quer uma igreja misericordiosa e representa em si mesmo o acolhimento. Bento XVI era inflexível, impiedoso, rigoroso, queria uma igreja fechada em si mesma. Francisco representa a Igreja das “catacumbas”, Bento XVI era o triunfalismo do século XIX e por aí vai.

Este contraste criado torna cada ação de Francisco, por mais bem intencionada que seja, um ataque a Bento XVI. Desde o início do seu pontificado Francisco vem “atacando” sistematicamente seu predecessor, seja na escolha de sapatos pretos, em oposição aos sapatos vermelhos do papa alemão, até o carro popular preso no trânsito carioca durante a JMJ contrastando com o desumano papamóvel usado por Ratzinger.

A mídia e uma parcela significativa dos bispos estão ajudando na cristalização desse contraste entre os dois papas. Eles querem deixar claro que, agora com Francisco, a Igreja finalmente abre os olhos. Para eles, Francisco é a ruptura em todos os sentidos – na práxis, na vida cotidiana, na sua origem, na sua abordagem litúrgica. É o papa do concílio que foi enviado para ligar a Igreja de hoje à Igreja de Paulo VI e João XXIII.

Mas nem tudo são flores.

O movimento restauracionista, encabeçado pelos prelados reacionários e ultrapassados da década de 1960 e 1970, parece não contar com a resistência dos bispos avant-garde.

Em duas entrevistas concedidas recentemente já se ouvem as vozes descontentes com Francisco. E não são as vozes irritantes e pequenas dos tradicionalistas, que podem ser solapadas com o rigorismo da lei canônica ou pelo subterfúgio da obediência impostos exclusivamente a eles. São vozes de peso na vida da Igreja.

Um Papa sem habilidades de gestão


Nós também queríamos alguém com boas habilidades de gestão e liderança, e até agora pouco foi visto neste ponto

As palavras acima são do cardeal arcebispo de Nova York, Timothy Dolan. Ele critica Francisco especialmente na demora na reforma da Cúria, de forma especial na substituição do secretário de estado que espera que aconteça, pelo menos, até o final de setembro.

Entre outros motivos, Francisco foi eleito para reformar a Cúria. Não uma reforma qualquer, mas uma reforma que, pelo que lemos até agora desde o início de abril, visa dar mais poder às conferências de bispos nacionais em detrimento do aparelho de governo pontifício. Isso se evidencia de forma especial nas palavras do próprio Francisco na solenidade de São Pedro e São Paulo:

"Confirmar na unidade: o Sínodo dos Bispos, em harmonia com o primado. Devemos andar por esse caminho da sinodalidade, crescer em harmonia com o serviço do primado". (…)  "O Pálio, se é sinal da comunhão com o Bispo de Roma, com a Igreja universal, com o Sínodo dos Bispos, é também um compromisso para cada um de vocês a serem instrumentos de comunhão".

Para Francisco o Papado é tratado como um dos instrumentos de comunhão ao lado do Sínodo dos Bispos; ambos devem “crescer em harmonia”. Algo análogo ao anglicanismo, onde o arcebispo da Cantuária é um dos vários instrumentos de comunhão, e à ortodoxia oriental que tem no patriarca de Constantinopla um “instrumento” de comunhão entre as várias igrejas nacionais. O grande problema desse pensamento é que um “instrumento de comunhão” é sempre algo simbólico e amórfico, diferente do papado que é um primado concreto de jurisdição universal.

Se para Dolan a demora de Francisco em reformar a cúria é o principal motivo para decepção, para Charles Chaput, arcebispo da Filadélfia, é a popularidade de Francisco e seu namoro com a mídia que despertam preocupações.

Numa entrevista a John L. Allen Jr.,
do periódico progressista americano National Catholic Reporter, o arcebispo Chaput afirma que os católicos conservadores e tradicionalistas “não ficaram muito felizes com a eleição de Francisco”.

Chaput é um dos bispos mais importantes da Igreja americana e será feito cardeal em breve, pois seu antecessor é ninguém menos que o Cardeal Rigali. Ele é ligado aos católicos “da direita”, isto é, aqueles que acreditam – pasmem! - que a doutrina católica deve ser seguida por todos os católicos sem negociações ou atenuações.

John L. Allen JR – Você acha que haverá um momento de acerto de contas depois que a lua de mel [entre Francisco e opinião pública] acabar?
Chaput - Vamos ver o que acontece. O papa pode ter uma forma de gerir tudo isso que será extraordinária, eu não sei. Eu acho que, em virtude de seu cargo, ele vai ser obrigado a tomar decisões que não serão agradáveis a todos.
Isso já acontece com a ala direita da igreja. Eles, no geral, não ficaram muito felizes com a sua eleição, a partir do que eu tenho sido capaz de ler e de entender. Ele vai ter que cuidar deles também, por isso vai ser interessante ver como tudo isso funciona a longo prazo.
John L Allen Jr – Alguns podem ler suas [de Francisco] observações aos bispos italianos significando que ele deixará os bispos locais lidarem com esses assuntos [aborto, casamento gay, eutanásia] em vez de fazê-lo ele mesmo. É essa a sua interpretação?
Chaput- Acho que o que ele disse aos bispos italianos é que ele não vai se envolver em questões políticas. Para mim, questões como o aborto e o significado do casamento não são questões políticas, elas são questões doutrinais e de moral. Todos nós, como bispos, incluindo o bispo de Roma, temos que falar sobre essas coisas. Seria muito estranho pensar que você possa fazer essa separação. Isso geralmente vem de quem quer dizer que essas duas questões são políticas, o que muitas vezes é o que acontece nos Estados Unidos. Nos dizem para mantermos o nosso nariz fora da política quando na verdade o nosso nariz está na moral.

Conclusão

Vemos que há sim bispos que ousam questionar, mesmo nesses poucos dias de pontificado, certas posturas ou, pelo menos, buscam esclarecer posições ambíguas.

O pontificado de Francisco se assemelha muito ao de Paulo VI. À época de Montini a ambiguidade no discurso e na ação era a regra. João Paulo II levou quase trinta anos para colocar um freio no episcopado rebelde e progressista, mas não podemos dizer que essa tarefa desempenhada pelo papa polonês foi plenamente bem sucedida. Exemplares fossilizados da época montiniana sobreviveram ao cataclismo joãopaulino e ainda hoje assombram as dioceses.

Francisco representa, para esses mastodontes mitrados, uma última oportunidade.

Dolan afirma que Francisco é composto do coração de João Paulo II e da mente de Bento XVI. Pessoalmente eu não ousaria ir tão longe, mas se essa imagem se concretizar, ainda que vagamente, creio que será um bem para a Igreja.

O que eu tenho visto até agora é confusão e desorientação. Precisamente nesse contexto nasceram grandes figuras do progressismo católico recente. Não podemos correr esse risco novamente.

Francisco quer uma Igreja que vá para as ruas e eu concordo plenamente. É um desafio! Sair da zona e conforto e ir ao encontro do desconhecido, num verdadeiro espírito missionário. Penso que é um excelente plano para a “direita” católica.

Precisamos ir às ruas antes que elas sejam tomadas pelos unidos e organizados “padres de passeata”, pelos “missionários sociais” e pelas “comunidades de base”. Eles tem apenas a vantagem da união e organização que faltam aos católicos “da direita”.

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