Creio que o problema da incompreensão foi o seguinte: não sou absolutamente contrário ao Papa pronunciar-se de forma informal, não-magisterial ou de qualquer outra maneira. É evidente que, se desejasse, o papa poderia escrever sobre qualquer tema, teológico ou não, e poderia fazê-lo de forma não-magisterial, ou seja, esses escritos seriam contados como obras separadas.
Mas o que acontece quando um papa escreve algo que DIVERGE daquilo que ele sempre vinha afirmando? Caos!
Um dos vários livros não-magisteriais que João Paulo II escreveu |
Imaginemos que o Papa João Paulo II, um papa mariano por excelência, também tivesse lançado um livro com Peter Seewald. O Papa polonês escreveu muitos livros fora do pontificado, lançou até mesmo um cd com orações e músicas. Algum problema com isso? Não, nenhum!
Prosseguindo, imaginemos que nesse livro fictício com Seewald o jornalista indagasse ao Papa: Você acha possível que Maria tenha sido concebida sem pecado? E a resposta do Papa, ou melhor, de Karol Wojtyla fosse: é possível que ela tenha sido concebida como uma pessoa ordinária, inclusive no pecado, o dogma da imaculada conceição seria apenas algo abstrato para reforçar a natureza divina e redentora de Cristo...
Ah! Eis o meu problema. Karol estaria contradizendo João Paulo II e todos os outros papas que o antecederam. O mesmo aconteceu com Bento XVI e o livro Luz do Mundo. Ele simplesmente contradisse, ou pelo menos relativizou, o que disse poucos meses antes, na África. Isso nunca aconteceu na história das Publicações Papais Fora do Contexto Magisterial.
Dom Rino enfrentou a fúria de conservadores e trad's por ter relativizado o ensinamento moral da Igreja |
Há a disputa virtual, agora já acalmada, sobre o que o Papa quis realmente dizer, sobre o contexto de suas palavras, etc. A mesma disputa, contudo muito menos equilibrada, se levantou no caso de Dom Rino, que alegou escrever a pedido da Secretaria de Estado. Contudo, não pretendo levantar todo o mérito da questão novamente. Simplesmente assino embaixo do recente pronunciamento feito pela Fraternidade Sacerdotal São Pio X que, para meu espanto, foi muito equilibrado. Normalmente a FSSPX faria um grande barulho e bradaria aos céus por justiça, mas dessa vez eles preferiram ser cirurgicamente precisos e, particularmente, é disso que eu gosto. Especialmente o item 3 da nota oficial da FSSPX sobre o assunto, mostra como a posição de Ratzinger relativisa, para dizer o mínimo, ensinamento da Igreja sobre o assunto.
Obras teológicas não magisteriais nos dias de hoje deixam o católico ordinário confuso. Quando o Papa está falando como sucessor de Pedro? A mídia sabe e se aproveita disso. |
A questão tem uma carga emocional muito forte, por isso divide tradicionalistas e conservadores que, como prova o caso de Dom Rino, se unem com muita facilidade para defender ferozmente a moral católica. Bento XVI é o Papa que mais restaurou a fé da Igreja nos últimos 50 anos, é o Papa dos Motus Proprios, que fez dom Burke cardeal, etc, por isso é tão querido, mas isso infelizmente não lhe dá um bônus para declarar o que está contido no "Luz do Mundo". É precisamente ai que se dividem as opiniões porque os tradicionalistas sabem disso, os conservadores preferem a visão mais "Poliana" das declarações, buscando contextos, momentos, etc.
Já que o livro é uma obra não-magisterial (graças a Deus!) podemos dizer sem qualquer dor na consciência: Bento XVI (ou Joseph Ratzinger, como eu prefiro nesse caso) errou e errou feio!
Já temos pelo mundo todo inúmeros organismos "católicos" que apóiam e distribuem preservativos. A própria "Pastoral da AIDS" brasileira é uma delas. Resta saber quem terá mais peso na formação da opinião moderna sobre o assunto: o Bento XVI da condenação explícita na África e atual guardião da Humanae Vitae ou Joseph Ratzinger do "o uso do preservativo pode ser considerado legítimo" em alguns casos?
Acredito que agora eu expliquei o queria dizer.